segunda-feira, 19 de novembro de 2012

um livro vivo, at last


E o que é um livro? Nasci com certa deficiência que me impede responder perguntas desta natureza com a objetividade científica que almejo um dia obter. Não tenho perfil para crítico literário, mais talvez para um embasbacado literário, que se deixa mergulhar naquilo que ama sem ouvidos que decodifiquem com prazer a fortuna crítica. E, mesmo assim, me vejo diante de uma interrogação tal. O que é um livro? Não é possível que os olhos que vêem não percebam mais que um amontoado de árvores mortas processadas, ou ainda um cemitério para o conhecimento. A tola idéia do livro como depósito de traças deveria ser extinta da face do planeta, junto com aqueles que a propagam. O poder simbólico do livro no seu aspecto físico é inegável, claro. Especialmente para os embasbacados literários como eu, que se deixam arrebatar pelo roçar duma página em outra, pelo cheiro de livraria, pelo prazer estético de amontoá-los desordenadamente, ordená-los por tamanho, cor ou tema, deleitar-se no gozo visual das capas bem feitas, desde as mais simples até as com letras douradas. Não, não, longe de mim negar esta força espacial que o livro tem. Mas quero, preciso ir além. O livro não pode ser apenas tato, nem tão pouco mero registro de determinado conhecimento ou verdades. Não. Quem já deu o suor por um, sabe. O livro é uma celebração dos teus momentos.















Breve um pouco mais. Bem dentro em breve!

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

pô, Drummond!




Nem mais-tarde, nem outro dia: eu quero poesia.

Olha que hoje vai ter muito o que dizer. First things first: desculpaê. Digo, alguém estava precisando de um break de blogue, né? A bem da verdade, não tenho certeza se há alguém neste momento lendo minhas desculpas – acho que posso me desculpar comigo mesmo, entonces. Foi mal, foi mal, life isn’t as sweet as it used to be.

Comecei a postagem assim, tão afirmativamente, tão definitivamente, porque ultimamente tenho me deparado com um bocado de manuais. E ‘manuais’ para além daqueles que você esquece no fundo da caixa do microondas (hífen ou nem?). Talvez seja o mal do curso de letras pra quem tem pavor a regras: se deparar com pessoas preocupadas em rotular. Longe de mim querer menosprezar toda a teoria literária, eu nem poderia, só fico meio desesperado com tanto ‘assim é’, ‘assim não é’. Uma vez que não sou teórico (vixi!), mas me apetece o escrever, só poderia mesmo me meter a questionar quem também, como eu, é dado a um palavreado. Sobrou pra tu, Drummond.

Ah, e by the way, longe de mim me meter a questionar Drummond. Pia mesmo! Eu, pequenininho, de letras minúsculas, me arvorar a desdizê-lo. Nam, nam. Se fosse pra desdizer alguém, eu o faria com o pessoal do caixabaixa. Mas é que Drummond me pegou num momento ruim: foi inventar de se mostrar manual (saque só o rapaz) justamente quando eu precisava do oposto. E vamos combinar: me pedir pra não escrever sobre o amor? Aqui tem uma série só sobre a quê ele serve. Quem (quem?) por acaso se aventurou a ler por aqui o que andei sangrando sabe que ele muito me agrada – tanto é que, vez em quando, ouso fazer dele referências (tipo aqui ou aqui). Já que eu não posso nem quero cutucar o minerin, deixei pro poema. Ele certamente fica maior do que isso com o tempo, segue só o exercício pra que se registre que nem o blog, nem minha poesia nem eu morremos – e EI tem um negócio ali embaixo da postagem chamado ‘menarca’. Clica lá pra ver o que acontece!




acordei e escrevi assim:
‘teu afeto

é tal com’água que
lava o meu corpo, que
mata a minha sede, mas
que também me afoga,
me garrafa,
me naufrágio.’
(ainda não é poesia, calma)








E, in case it has not been clear, reforço: Aqui não há ranço com o mineiro. Nunca!, meu problema é com aqueles que o legitimam de maneira tal que só e somente a ele o fazem. Há, por cá, uma maneira no mínimo triste de ler a poesia/prosa brasileira através d'uma ótica teórica nublada que acaba, por fim, a privilegiar determinados autores. Drummond é um; Machado é outro. É só meu jeitinho de dizer: caras, olhem para os lados.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

carta uma

Coimbra, Julho de 2012.

Hoje fiz uma das coisas que gostaria de fazer o resto da vida. Gabi me convidou para descer e ler um pouco na beira do rio.
Tiramos uma canga colorida, daquelas de praia, que enfeitava a parede do quarto dela, e a transformamos numa bolsa com apenas dois nós. Dentro dela, três livros, uma garrafa de água, maçãs e alguns biscoitos. Enquanto o sol atacava as águas do Mondego, ficamos eu e minha irmã deitados na grama a ler, protegidos pela sombra amiga das árvores, as folhas dançando pelas lambidas do vento, e abraçados pelo verde da grama cheirosa de verão. Deixei, pois, que minha vista passeasse pelas palavras de Milan Kundera (um romance que você me emprestou). Ele me acalenta a alma enquanto você não chega pra juntar-se a nós. Foi aí que Tomas, um circunstancial personagem do tal romance que leio, me surpreende com um gesto dos mais doces: depois de uma noite repleta de sonhos, ele se acorda antes de Tereza, sua esposa. Ela dorme pesadamente ao seu lado e mantém uma mão dele dentro de uma sua. Ele a observa, o amor escorrendo dos olhos. Ela, como que sentindo sobre si um peso de olhar, dá um pequeno passo em direção ao acordar – entreabre os olhos. E indaga, semidormindo, o que ali olhava Tomas.
*****
eu, por muitas vezes, te olhava.
tu, por muitas vezes, me indagava.
eu, muitas vezes, te dizia
não é nada
não é nada
(apenas apreciava)
 - não dei a sorte de
ser circunstância de
Milan Kundera.
*****
E o que ali olhava Tomas?
Na resposta, ele soube fazer caber o mundo inteiro. Disse-a, vejo as estrelas.

...e eu aqui, à beira do Mondego, fiquei sem fôlego. Tenho um dever para com os teus sonhos. E não vou deixar passar as lições de Tereza e Tomas.
Hoje eu fiz uma das coisas que gostaria de fazer o resto da vida ao teu lado.




sexta-feira, 8 de junho de 2012

a vitória da poesia #2

'o poema, a lâmina, a chama, a canção
subvertem a ordem obscura da vida'

[José Rodrigues]

Começo desse mês eu ganho um presente. Um não, dois. O primeiro se chama Flávio, o segundo se chama Nyka.



Não entendeu o título da postagem?

Não entendeu o motivo da celebração?



domingo, 8 de abril de 2012

não entendEu

‘entender é parede, procure ser uma árvore’
[Manoel de Barros]

                Andei por adquirir o agradável hábito de rechear as caixas de e-mail de Matteo Ciacchi, o meu já parceiro daqueles bons-velhos textos a dez mãos, com aquilos nos quais mais ouso. Vez por outra vou lá puxar no pé dele, aperreá-lo por um feedback. Esse foi o mais recente. O texto nem me agrada taaaaaanto, ora veja, mas a resposta de Matteo ao recorrente questionamento ‘o que foi isso que eu fiz, hein?’ foi tão feliz que resolvi trazê-la na íntegra junto com seu objeto. Oh lá!!

Isso, Gustavo, é uma forma sonata do período romântico tardio - formalmente bem definida, com elementos episódicos não relacionados com o todo, grupos temáticos contrastantes porém relacionados, um desenvolvimento e uma coda com elementos dos grupos temáticos - e é na coda que há mais elementos da tonalidade extendida, quase atonal, um colorido harmônico incomum que dá uma cara completamente diferente aos motivos do tema. Se Schubert tivesse nascido um pouquinho mais tarde talvez ele tivesse composto alguma coisa parecida com isso. Escuta a última sonata pra piano que ele compôs: o primeiro movimento é bem parecido com isso aí.
De Matteo, por e-mail.




Olha.
Os barcos já vão zarpar.

Olha.

Sofro severamente de absurdo. Vinha outro dia a caminhar rua abaixo, mãos no bolso, coração ajeitadamente no peito, pés nos sapatos quando, de repente, algo me pus a assobiar. Ora, até aí nada demais, huh? Algo pus-me a assobiar pelos olhos. Ora, vejam só. Ou não vejam, huh, assobiem. Há-que muito ser-se absurdo para propor-se assim a algo. O fato é que não me propus. Algo me pôs, algo me pus. Assobiava pelos olhos. E a boca cheia de lágrimas-proto. Afora isso, continuava a caminhar tranquilamente abaixo a rua, os bolsos nas mãos, o peito ajeitadamente arranjado ao redor do coração, sapatos aos pés. Uma luz mínima de juízo sentido que restava em mim, porém, sentia-se severamente desconfortável com aquela situação. Já não tenho mais idade pra viver assim atravessado.

Caminhava um homem, eu, rua abaixo. Assobiava pelos olhos, trazia trancadas a boca milágrimas. Milagre. Eita! Sorte minha que ninguém parou a me cumprimentar. Sentei-me a um banco de praça qualquer. Bebi lágrima-a-lágrima, bebime. Respiro fundo, cessa a música. Ponho-me a andar.

Olha. Os barcos já vão zarpar.

Meus olhos servem de perfeita moldura as minhas rugas. Exceto quando assobiam Brahms. Segui seguindo rua abaixo, tudo nos trinques, nos conformes. O corpo perfeitamente envolto na roupa. As idéias perfeitamente enterradas sob os meus cabelos. Ainda os tenho, vera que pouco. Siga, eu. Eis-aí que meu mal vez mais uma me ataca. Ponho-me a caminhar aos pés de ponta. Pés de ponta!! Como bailarina fosse! Ora, mais que. Ora mais que!! Sincronizasse o movimento dos braços com o das pernas, esse homem eu era já quase uma pantera de televisor. Afeito aos absurdos que meu corpo me impõe, com exceção do mínimo luz que já me ainda resta. Bah. Paro. Res. Pir. o. Fffff. Quando respiro, gosto que o ar saia entre meus dentes da frente. Fffff. Fffff. Tem cura, doutor?

Zarparam os barcos. Olha.Olha.a

Continua eu ruabaixo. Já há-visot miahn caas. Grasaç a Desu! Fazi agluns mutnios qeu mues desdo naõ Parma de estlarar frenteiacmente. Timbalada nos meus dedos. Timbalada!! Estou quase vomitando um hino evangélico. Corremos eu e os meus frenéticos doigts em direção ao portão de casa. Trabalhosamente enfio as mãos no bolso em busca das chaves. Se as achar, provavelmente as derrubarei no chão, esses dedos que non-stop. Dito-feito. Chaves no chão, cu na mão. Se ainda há alguma coisa nas mãos, samba por entre os dedos. Samba. Haha.

Aperta os olhos pra ver os barcos.
Não vê mais.


quarta-feira, 21 de março de 2012

a pele, revival

Lembram que eu postei essa danada por aqui no meu dia? Pois é.

Dessa vez resolvi trazê-la a tona neste revival porque Rinah Souto, a generosa moça que deu cor na canção minha e de Chico Limeira, cantou a canção no seu mais recente concerto na Estação Ciência. O resultado 'cês vêem nesse vídeo. Na qualidade de autor, pouts!, a pele arrepiou. Tem alguém aí? Se tem, deixa uma menarca. Chico, Rinah e eu vamos ficar bem contentinhos :)

quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

alguém, só que no feminino

‘woman, I know you understand the little child inside of the man’
[Mr. Lennon]

                Eita, que eu ando fevereiro! Já mais de mês que eu me devo um texto assim, uma postagem assim, uma coisinha assim. Espero que gostem! :D



E agora há uma paisagem que me grita nos ouvidos, na memória, alguma coisa em indeterminado idioma. Paisagem antes útil, antes inútil. Never fútil. Aqui é uma praia relativamente clara, por trás passa uma avenida meio larga de cinza negro asfalto. Carros poucos, senhoras gordas caminham suas vidas pela calçada, um homem muito queimado de sol e pobreza vende cocos e a si pelo valor dois reais. Aqui tem um quiosque atrás do outro. Todos diferentes, todos iguais. Aqui na areia minha lembrança cata um canudo, embalagens de picolé caseiro, marcadores de livro, um par d’óculos que alguém esqueceu. Aqui catei uma embalagem de camisinha usada. Espero não encontrar a danada. Olha que minha lembrança catou agora um grupo de homens bonitos/ou não jogando vôlei. Jogam mal?, não me interessa. Isso não me interessa. Minha lembrança catou alguém sentado na areia. Por que a palavra ‘alguém’ é masculina?, ora que o alguém que eu vejo é mulher. Sim, mulher. Minha lembrança observa pelo canto do olho alguém sentada na areia olhando o mar. Reconhece? Reconhece. Aqui o nome dessa alguém poderia ser Larissa, Gabriela, Mariana. Poderia bem ser Marina, (i)Nara. Cecília, Carolina, Lua. Talvez carregue nome estrangeiro. Ananda, um ar de rio nas bochechas. Aí você pensa ‘será que ele quis dizer ar de riso e engoliu uma letra?’. Não. Minha lembrança é precisa, era ar de rio mesmo nas bochechas. Olha que é aqui que o doce encontra o mar. Poema na curva dos lábios. Seu nome aqui pudera ser Dôra, Giovanna. Pudera ser Anita. A mulher abraça seus joelhos, ajeita sobre o nariz os olhos escuros sobre os olhos de verdade. Minha lembrança não precisa de olhos escuros pra ver essa alguém. Capaz de seu nome ser Luíza, Jade, Raquel. Se for Raquel e tiver uma irmã, pode que seu nome seja mesmo é Ruth. Minha lembrança não vê novelas, mas escuta. Minha lembrança também pega ônibus. Capaz seu nome seja cor-de-Rosa,  Roseane. Olha que aqui a mulher já espichou novamente suas pernas. Água doce desaba de suas bochechas, algumas gotas minha lembrança catou sobre a areia pra levar pra casa. O doce encontra o sal? Não sei. Seu nome é Lucia? Lucinete? Aqui ela se levantou sobre os dois pés na areia. Abriu os braços pro mar. Beba-me. Deu um grito? Não sabe, minha lembrança não a observa de tão perto que a escute. Põe a mão nos bolsos e vai embora. Aqui seu nome agora era Saudade. Ou era Déa? Regina? Não. Era Saudade mesmo. Era Maria.


quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

e etc.

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome. [...]’
[João Cabral de Melo Neto]


                Começar 2012, um ano que tem toda uma aura apocalíptica-midiática-cinematográfica, falando de amor. Quer melhor presságio que esse? Espero que essa brincadeirinha vos agrade :] Que o ano que começa seja de muita luz – só assim pra gente enxergar as coisas boas que merecemos e aquelas que necessitam de uma lustrada. Feliz ano novo, meu povo. Ah, e vou dedicar a postagem de início de ano à Profa. Cida. Se ela tiver lendo isso agora, queria um comment :B


I
¿amor uma hora dessas?


II
 - ¿me ama?
 - inhame.


III
em Mianmar
‘inda se morre de
saudade.